“Antes de te formar no ventre materno, eu te escolhi: antes que saísses do seio da tua mãe, eu te consagrei” (Jr 1, 5)

Karen Bueno – Neste dia 8 de outubro a Igreja no Brasil celebra o Dia do Nascituro e a conclusão da Semana Nacional da Vida. Conversamos com famílias que têm muito a dizer sobre a escolha pela vida. Veja abaixo essas histórias e os testemunhos:

“A vida de um filho não vale mais que a do outro”

Jéssica e Eduardo Leite de Campos, de São Paulo/SP, receberam um presente especial no início de 2019: a gravidez dos gêmeos univitelinos Lucas e João Marcos. Tudo corria bem até a 17ª semana de gestação, mas a ultrassonografia mostrou um problema grave: a restrição de crescimento intrauterina poderia levar ao óbito de um ou dos dois bebês.

O bebê menor pesava menos de 300g e Jéssica não poderia tomar remédios para o seu desenvolvimento: o que melhoraria o fluxo sanguíneo do bebê menor, prejudicaria o outro.

Para um dos médicos, a intervenção cirúrgica era o melhor caminho para tentar salvar o bebê maior – o que significava sacrificar o bebê menor. O casal, porém, não aceitou esta opção. Seguindo a equipe médica que vinha acompanhando o caso, decidiram viver “um dia de cada vez”. Jéssica explica essa escolha: “Sendo a favor da vida, sempre em qualquer situação, coube a mim zelar pela vida dos dois igualmente. A vida de um filho não vale mais que a do outro”.

Poucas semanas depois, porém, a cirurgia foi inevitável. Contando com muitas orações e entregas ao Capital de Graças, um novo exame de ultrassom apontou estabilidade no quadro. Exame após exame, a cirurgia foi sendo adiada até ser descartada.

A mãe comenta: “A vida é preciosa desde sua concepção. Tinha que escolher entre um filho morto e outro com sequelas ou os dois mortos (as opções que os médicos me deram, caso não fizesse a intervenção cirúrgica) eu optei por ter os dois vivos! Esperei até o fim, preferia explicar para meus filhos o motivo de uma possível sequela do que explicar porque eu simplesmente desisti da vida de um deles. Que confiança eles teriam em mim no futuro?”.

Os bebês nasceram na noite de 12 de novembro, com 33 semanas de gestação (muito além do esperado pela equipe médica). João Marcos, o mais velho, nasceu com 2,395 kg e teve alta no dia 30 do mesmo mês. Lucas, com 1,495 kg, teve alta quando completou um mês. Ambos são saudáveis do ponto de vista físico e neurológico.

Nossa filha nos espera no céu

O casal Luciano e Flavia Ghelardi, da União de Famílias de Schoenstatt, teve uma experiência profunda com a gestação da Julia, sua quarta filha. O diagnóstico mostrava que Julia (com displasia tanatofórica) não seria capaz de sobreviver depois do parto e Flávia também corria risco de morte durante a gestão. Apesar das adversidades, o casal estava convicto de que tudo tem um propósito maior e seguiram adiante amando e acolhendo a menina como fizeram com todos os outros filhos.

Ao contrário das expectativas médicas, a Julia nasceu e conviveu por 5 meses preciosos junto de sua família. “Cada alma criada por Deus tem uma missão a cumprir, mesmo que o tempo de permanência aqui na terra seja pequeno. Fomos criados para amar e sermos amados e a Júlia, nos pouco mais de 14 meses que viveu (9 na barriga e 5 na UTI), pode sentir todo o nosso amor. Agora ela já goza da alegria plena no Céu, junto de Deus, o Amor Infinito, e de lá pode interceder por nós”, diz a mãe.

Mas, se a criança não tem chance de sobreviver, por que levar uma gravidez adiante? Para Flávia e Luciano, existem diversos motivos: “O fato de ter uma filha no Céu estimula a nós, seus pais, e também os seus outros três irmãos, a buscarem a santidade aqui, para um dia podermos reencontrá-la e passarmos toda a eternidade juntos. Nesses 12 anos que ela partiu, sua história já tocou a vida de muitas pessoas, a começar pelos próprios médicos da UTI onde ela ficou, pois fizeram algumas mudanças nos cuidados de bebês como ela, sem perspectiva de cura. O sofrimento faz parte da vida e é impossível de ser evitado. Ele é permitido por Deus para aprendermos a ser menos egoístas e, assim, poder viver a plenitude do amor. Ficamos mais fortes e mais generosos. Por mais que a gestação e depois a vida na UTI da Julia tenha sido muito sofrida, sabemos que tudo concorre para o bem daqueles que amam a Deus e que todo esse sofrimento foi transformado em inúmeras graças para a nossa família e para muitas outras pessoas também. Não conseguimos imaginar a nossa vida sem a Júlia”.

Mas, eu não posso ficar com o meu bebê, o que eu faço?

Ao falar de aborto, não se pode fechar os olhos para a situação complexa em que muitas mulheres estão envolvidas. Por diversos motivos – financeiro, familiar, físico, emocional… – existem gestantes sem condições de ficar com a criança. O que fazer nesses casos?

Por lei, no Brasil, as mulheres têm o direito de entregar seus filhos à adoção. O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios explica que a chamada “Lei da Adoção” (nº 13.509/2017) “trouxe alterações ao Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e incluiu a chamada ‘entrega voluntaria’, que consiste na possibilidade de uma gestante ou mãe entregar seu filho ou recém-nascido para adoção em um procedimento assistido pela Justiça da Infância e da Juventude”. E salienta: “Ao contrário do que muita gente pensa, a mãe que dispõe seu filho para adoção não comete crime, a lei permite a entrega para garantir e preservar os direitos e interesses do menor”. 

[1]

Segundo essa lei, as mulheres que demonstrem interesse em entregar o filho precisam procurar a Justiça da Infância e Juventude. “Se não for encontrado parente apto a receber a guarda da criança, a autoridade judiciária competente determinará sua colocação sob guarda provisória de quem estiver apto a adotá-la ou em entidade que desenvolva programa de acolhimento familiar ou institucional”. [2]

A assistente social Márcia Corrêa trabalha no Centro Catarina Kentenich, em São Paulo/SP, e explica que existe o Saita, Serviço de Acolhimento Institucional para Crianças e Adolescentes. “Até mesmo antes da criança nascer a mãe pode procurar a Vara da Infância e da Juventude, ou, quando nasce, abrir mão da guarda. Se a criança já for maior, procurar o Conselho Tutelar. A criança vai para um abrigo e passa por um processo de adoção. Geralmente, quando ocorre essa procura, a mãe está envolvida em situações complicadas, como prostituição, drogas, situação de rua, porque ela mesma, muitas vezes, foi negligenciada no passado…”

Para todo católico, é fundamental aquilo que está registrado na Doutrina da Igreja: “O inalienável direito à vida, por parte de todo o indivíduo humano inocente, é um elemento constitutivo da sociedade civil e da sua legislação: «Os direitos inalienáveis da pessoa deverão ser reconhecidos e respeitados pela sociedade civil e pela autoridade política. Os direitos do homem não dependem nem dos indivíduos, nem dos pais, nem mesmo representam uma concessão da sociedade e do Estado. Pertencem à natureza humana e são inerentes à pessoa, em razão do ato criador que lhe deu origem. Entre estes direitos fundamentais deve aplicar-se o direito à vida e à integridade física de todo ser humano, desde a concepção até à morte»”. [3]

[1] Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios: https://www.tjdft.jus.br/institucional/imprensa/campanhas-e-produtos/direito-facil/edicao-semanal/entrega-voluntaria-de-adocao

[2] Idem

[3] Catecismo da Igreja Católica, 2273

 

Fonte: schoenstatt.org.br