Preguiça, comodidade, egoísmo, pretensão? Cada um tem sua ferida…
Frequentemente, eu experimento a fragilidade em minha própria carne. O mal, o demônio e o mundo me tentam. E fazem isso para que eu não faça o bem, para que eu não ame.
São as marcas deste pecado original que me fazem nascer quebrado, ferido por dentro. Adão e Eva foram tentados. Queriam ser como Deus. Poderosos como Ele.
Não estar submetido a nenhuma lei, a nenhuma proibição. Não ser humilhado. Esses são os desejos de meu coração.
Vejo em mim a dolorosa cicatriz dessa ruptura tão profunda. Quero ser amado no mais profundo do meu ser. Mas as decepções, as feridas, as frustrações e os fracassos me deixam debilitado. E dessa ferida brota meu pecado. Minha falta de capacidade para amar.
O padre José Kentenich falava dessa ferida, dessa incapacidade que sempre nos lembra que somos frágeis: “Devemos verificar onde reside, no mais profundo, o ponto fraco de nossa natureza. Se eu o conheço, então sei como devo me educar até o fim da vida. Jamais devemos pensar que terminamos nossa educação. O bom Deus me educa pessoalmente” Da minha ferida de amor brota o meu pecado. Como o da árvore proibida. Deixo de fazer o que é bom para mim e para os outros. Eu me torno escravo das seduções do mundo, indo de um lado para outro como uma barca à deriva. Diz o Papa Francisco: “Como o profeta Jonas, sempre carregamos latente a tentação de fugir para um lugar seguro, que pode ter muitos nomes: individualismo, espiritualismo, fechamento em pequenos mundos, dependência, repetição de esquemas pré-fixados, dogmatismo, nostalgia, pessimismo, refúgio nas normas. Talvez nós resistamos a sair de um território já conhecido e administrável. No entanto, as dificuldades podem ser como as tormentas (…) e têm a função de nos fazer voltar a Deus, que é ternura e quer nos levar a uma mudança constante e renovadora” [2]. A tentação da preguiça, da comodidade, do egoísmo. Como Jonas, quero me esconder onde Deus nunca possa me encontrar. Ou desparecer de sua vista para não fazer o que Ele me pede. Longe dos homens, que me perturbam com suas exigências. Longe do bem, que é exigente e pede que eu dê o melhor que há em mim. Não quero viver em sua presença. A maior tentação é querer ser como Deus. Querer ser o todo poderoso. Saber tudo, controlar tudo. Fujo de mim mesmo para não me encontrar com Deus. Uma vida em que é preciso dar tudo até o último suspiro me assusta. Entregar meu coração inteiro, sem restrições. Ter que manter sempre uma atitude misericordiosa e bondosa também me assusta. Sou tentado a não dar, a guardar para mim. A viver para mim, não para os homens. Permanecer inteiro, a salvo; não ser partido por dentro. A alma dói. Olho para o meu interior. Vejo uma fraqueza profunda. A raiz dos meus pecados. Comprovo a minha verdadeira falta de liberdade. Meu medo de amar ao extremo. A tentação de não depender de ninguém e ser mais livre, dono do meu tempo, da minha vida, do meu descanso. Medo de amar de verdade. Medo de parecer frágil. Por que preciso me reconhecer frágil diante dos homens? Não preciso. Posso viver ilhado dentro de mim. E ser feliz sem que ninguém conheça a minha necessidade de dependência. Não quero ser filho. Talvez seja esta a fonte de todos os meus pecados. Nego-me a ser o filho dócil aos desejos de um Pai que me ama. Essa negação é a fonte dos meus pecados. Creio que eu possa caminhar sozinho, lutar, conquistar mares desconhecidos. Olho a minha alma enferma e me confronto com o que não consigo fazer. Observo Deus e me escondo bem longe. Esse temor do homem em deixar ser visto por Deus… Mas sim, Ele já me conhece. Esqueço-me de que Ele sabe tudo. Ele me pergunta: “Onde estás?”. E eu só conto parte da verdade. Busco desculpas que amenizem o meu pecado. Endosso minhas faltas. Dissimulo minhas quedas. Não quero me mostrar frágil. Sequer para quem sabe tudo. Diante Dele, também justifico o que eu faço. E penso que Deus deseja tudo isso para que eu seja feliz. Comer do fruto proibido. Ou o da árvore que me fará ver as coisas como Deus vê. E a primeira coisa que eu comprovo é minha própria nudez. Não consigo saber tudo, mas descubro que estou nu. Que não tenho nada que me faça merecedor de um prêmio. Que meus méritos não valem nada. A infidelidade me dói muito… Escondo-me com medo de mim mesmo. Não estou vestido. Vejo minha pobreza e me assombro, me assusto, me escandalizo. Não sou capaz de observar minha pequenez com paz. Então, ouço a voz de Deus dentro de minha alma. Ele me diz que me ama como eu sou. Este olhar de Deus é o que me cura, que me salva e me faz capaz de amar. É o que quero! Por: Carlos Padilla Esteban | Imagem: unsplash ___________________________________________________ [1] J. Kentenich, Desiderio desideravi, 1963, conferencia 59 [2] Papa Francisco, Exhortación Gaudete y Exultate